Nesta segunda-feira (27), a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou possível que a impenhorabilidade do bem de família atinja simultaneamente dois imóveis de um devedor, aquele onde ele mora com sua esposa e outro no qual vivem as filhas, nascidas de relação extraconjugal. A decisão foi pautada no princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, para garantir a proteção da entidade familiar no seu conceito mais amplo e resguardar o direito fundamental à moradia.
Para o promotor Cristiano Chaves de Farias (BA), diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), a decisão serve de paradigma a orientar os juízes e tribunais brasileiros, despertando a ideia de que a família protege pessoas e que não é preciso ser o modelo tradicional ou casamentário de família para merecer a proteção jurídica. Ele avalia que o precedente aberto pelo STJ com essa decisão orientará uma concepção de família múltipla, plural, ampliando a proteção da pessoa humana e do direito constitucional à moradia, consagrado pelo art. 6 º da Carta Constitucional, como um direito fundamental.
O caso
O devedor, ao ser intimado para penhora, alegou que o imóvel em que vivia era bem de família e indicou, em substituição, um segundo imóvel. Após a substituição do bem penhorado, o devedor alegou que este também era impenhorável por se tratar igualmente de bem de família. Disse que neste segundo imóvel residiam suas duas filhas e a mãe delas.
Como a Justiça não reconheceu a condição de bem de família do segundo imóvel, a mãe, representando as filhas, ofereceu embargos de terceiros para desconstituir a penhora incidente sobre o imóvel em que residiam. A penhora foi afastada na primeira instância, mas o TJMG reformou a decisão. Por maioria de votos, o TJMG decidiu que a relação concubinária do devedor não poderia ser considerada entidade familiar, nos termos da legislação em vigor.
A Terceira Turma do STJ reformou esse entendimento, considerando que a impenhorabilidade do bem de família visa a resguardar não somente o casal, mas o sentido amplo de entidade familiar. Assim, no caso de separação dos membros da família, como na hipótese, a entidade familiar, para efeitos de impenhorabilidade de bem, não se extingue, ao revés, surge em duplicidade: uma composta pelos cônjuges e outra composta pelas filhas de um deles.
Toda família merece proteção do Estado
No entendimento do Superior Tribunal de Justiça não existe qualquer distinção entre os diferentes meios de constituição de uma família. Explica o promotor Cristiano
de Farias que, essa "parametrização" do STJ atende à diretriz do caput do art. 226 daConstituição da República: toda e qualquer família merece especial proteção do Estado, ou seja, a decisão reforça a ideia de que não há hierarquia nas formas de família, bem como não há distinção entre filhos gerados dentro e fora do casamento.
Pode-se inferir da decisão, conforme Cristiano Chaves, que o Judiciário avança no sentido de reconhecer a legitimidade das famílias simultâneas. A simultaneidade dos núcleos familiares há de ser admitida na ambiência da proteção da pessoa humana. A família serve para proteger as pessoas que a compõem. Por isso, justifica-se a tutela jurídica decorrente da decisão, assegura.
O promotor destaca, ainda, que a decisão priorizou a proteção especial à pessoa humana e ao direito à moradia, consagrando uma concepção instrumental de família.
Autor: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações do STJ)
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